Segundo números dos Estados Unidos da América, cerca de 250.000 Artroplastias Totais de Joelho (ATJ) são realizadas anualmente naquele país, e funcionam bem (sobrevida 95% acima de 10 anos). A maioria dos pacientes atinge 110-120* de arco de movimento do joelho e acima de 70% sobem e descem escadas sem nenhuma dificuldade. As taxas de infecção estão abaixo de 1% e as avaliações subjetivas mostram os pacientes muito satisfeitos com a cirurgia.
Entretanto, nem tudo funciona completamente bem. Com aumento de nossa sobrevida e com a realização de cirurgias em pacientes cada vez mais jovens, é natural que ocorra um crescimento considerável de revisões (10-15% das cirurgias primárias). O polietileno sofre desgaste natural, o cimento pode fragmentar, o suporte ósseo sofre remodelação, infecções à distância podem atacar o joelho com prótese. Assim, resultados muito satisfatórios podem falhar após 10-15-20 anos.
Muitos destes pacientes podem se beneficiar com procedimentos de revisão. A cirurgia de revisão normalmente é mais difícil que as cirurgias primárias, porém com um planejamento adequado muitos cirurgiões podem realizá-la de maneira adequada e efetiva.
PLANEJAMENTO PRÉ-OPERATÓRIO
O planejamento deve fazer parte de qualquer cirurgia, porém nas cirurgias de revisão de ATJ isto se faz muito mais necessário, para que surpresas não se apresentem durante a cirurgia, e se elas surgirem, as soluções já estejam em nossa mente.
A avaliação da causa da dor (geralmente o sinal mais comum) após ATJ, é crítica e fundamental para firmar um diagnóstico correto e planejar o tratamento mais adequado. Uma revisão de ATJ realizada sem diagnóstico preciso, tem muita chance de levar a novo insucesso.
Um dos primeiros passos, é determinar a causa da falência, se existe ou não infecção presente (fig.1), através de RX, ex. laboratoriais, Cintilografia, punção articular, ou outros exames necessários.
As causas de falência asséptica (fig.2) podem ser divididas em 3 categorias: – fatores do paciente / desenho dos implantes / técnica cirúrgica.
O aparelho extensor deve ser visto com muito cuidado, pois muitas vezes as causas de falha são devidas a problemas da patela, componente patelar, mau alinhamento patelar, rotação dos componentes, etc. (fig.3)
As radiografias devem ser bem avaliadas com o uso das transparências (“templates”), para se determinar o possível tamanho dos implantes, a necessidade de hastes intramedulares, aumentos/calços, enxerto ósseo, etc.
Devemos determinar que tipo de estabilidade (“constrição”) será necessária durante a cirurgia, ou seja, estabilização posterior, médio-lateral, articulada tipo “dobradiça”. A modularidade das próteses atuais nos permite uma customização adequada durante a cirurgia (fig.4).
A seguir relatamos um “check list” que nos será muito útil para que a cirurgia seja realizada da maneira mais adequada possível.
CIRURGIA PRÉVIA
- Que tipo de implante foi usado ?
- Qual era o tamanho de implante ?
- Tem história de calor local ou drenagem persistente na cirurgia anterior ?
INFECÇÃO
- Os exames laboratoriais são sugestivos de infecçao ?
- As alterações radiográficas sugerem infecção ?
- Cintilografia foi realizada ? É positiva ? Caso seja negativa = afasta infecção.
- Punção e cultura do material foram realizadas ?
- Se necessário, fazer biópsia de sinovial ou material articular p/ exame anatomo-patológico;
- Será utilizado cimento c/ antibiótico na cirurgia ? Já vem junto c/ o cimento ou será adicionado ? Está disponível ?
EXPOSIÇÃO / ACESSO ARTICULAR
Incisões prévias ? Cuidados p/ evitar necrose de pele (fig.5);
Osteotomia da tuberosidade tibial (TAT) será necessária ? (fig.6-A-B). Fios de aço e/ou parafusos estão disponíveis para fixação ?
– A presença de um cirurgião plástico será necessária p/ possíveis coberturas e/ou retalhos cutâneos ?
REMOÇAO dos IMPLANTES PRÉVIOS (fig.7 / 8-A-B / 9-A-B)
– Parafusos periarticulares – tipo de cabeça do parafuso ? Chave adequada disponível ?
– Instrumentos p/ remoção dos implantes / cimento ósseo – serra de Giglie, osteótomos finos e flexíveis, brocas, curetas – material especial p/ remoção do cimento ?
– Extratores dos componentes estão presentes ?
IMPLANTES DE REVISÃO (fig.10-A-B)
– Que tamanho de componente femoral e tibial será necessário ? Que tipo de estabilidade (“constrição”) será utilizada ? O material de revisão permite esta customização ?
– Hastes / calços femorais e/ou tibiais serão necessários ? Diversos tamanhos disponíveis ?
– Implantes e hastes “offset” serão necessários e estão disponíveis ?
ENXERTO ÓSSEO
– Defeitos ósseos foram previamente avaliados ? (fig.11-A-B-C). NÃO esquecer que na cirurgia, os defeitos são c/ freqüência maiores que aqueles observados nas radiografias;
– Tipo de enxerto necessário ? Estrutural – esponjoso ?
– Enxerto autólogo – homólogo (banco de osso disponível) ?
DIVERSOS
– Sangue – reposição / autotransfusão / etc ?
– Imobilização pós-operatória (órtese / gesso) ?
Quando avaliamos com cuidado as possíveis causas de falha da ATJ primária e planejamos corretamente nossa cirurgia de revisão, podemos ter uma grande chance de sucesso neste procedimento difícil e complexo, obtendo-se resultados satisfatórios ao paciente, que é nosso principal objetivo no tratamento. (fig.12-A-B)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 – Laskin RS. Ten steps to an easier revision Total Knee Arthroplasty. Journal of Arthroplasty Vol.17, N.4, Suppl.1, pg. 78-82, 2002.
2 – Saleh KJ, et al. Modes of failure and preoperative evaluation. JBJS Vol.85-A, Suppl. 1, pg. 21-25, 2003.
3 – Archibeck et al. What’s new in adult reconstructive knee surgery. JBJS Vol.86-A(8), August/2004.
4 – Engh & Rorabeck. Planning the revision surgery. In Revision Total Knee Arthroplasty. Pg. 63-191. Williams & Wilkins, 1997.
LEGENDAS DAS FIGURAS
1 – RX – 9 meses PO – Infecção
2 – RX – Soltura asséptica = 4 anos PO
3 – Falha aparelho extensor – Soltura componente patelar
4 – Modularidade dos componentes
5 – Lesões de pele
6 – A – Vias de acesso
– B – Osteotomia TAT
7 – Retirada componente femoral – Serra de Giglie
8 – A – Retirada componente femoral – osteótomo
– B – cirurgia
9 – A – Retirada componente tibial
– B – cirurgia
10 – A / B = Implantes de revisão
11 – A / B / C = Defeitos ósseos (fêmur / tíbia / cirurgia)
12 – A / B = RX PO imediato (frente / perfil)
FOTO – Rogerio Fuchs
LEGENDAS DOS FILMES
1 – Pré-operatório – instabilidade
2 – PO final = flexão
3 – PO final = estabilidade